A Fita de Möbius é hoje considerada um objeto matemático de grande interesse pelas implicações surpreendentes que tem nos vários domínios do conhecimento, sendo certo que algumas ainda são desconhecidas. Deve o seu nome a August Ferdinand Möbius, que a estudou em 1858 (influenciado por F. Gauss, considerado um dos maiores matemáticos de sempre), dando origem a um novo campo da matemática – a Topologia.
A construção de uma Fita de Möbius é tão simples que chega a ser desconcertante:
– Obtém-se pela colagem das duas extremidades de uma fita, após efetuar uma meia-volta numa delas.
Todos os estudos desenvolvidos posteriormente levam-nos para demonstrações em matemática avançada a qual não é, aqui, objeto de atenção. Contudo, todo este trabalho matemático sustenta um conjunto de conclusões que podem ser compreendidas de forma mais clara, quando se enumeram algumas das suas propriedades mais evidentes.
Propriedades e Utilidade
No âmbito da topologia:
Aplicação:
“… o propósito da Matemática é uma divina loucura do espírito humano…”
Alfred Whitehead.
Abordagem Filosófica
Como podemos entender a Fita de Möbius do ponto de vista da Filosofia?
O aspeto, porventura, mais desconcertante da Fita de Möbius (designada doravante por “Fita”) é o facto de, partindo de uma simples fita com dois lados, através de uma ação física – operando uma meia-volta numa das extremidades da fita e colar – esta se transforma num objeto inédito, totalmente diferente, de apenas um lado que nos abre as portas para um espaço fascinante – o espaço topológico – que, à primeira vista, parece não ter qualquer ligação com a Filosofia.
Contudo, atentos a este evento, se considerarmos que esta meia-volta num objeto físico, concreto, é a génese de uma transformação em que dois lados finitos, surpreendentemente, passam a ser um e um só lado sem limite, ou seja, infinito, e que esta transformação é definitivamente algo de inédito, então temos aqui as condições mais do que necessárias para encetar uma abordagem filosófica, uma vez que temos um espanto (!) que nos desperta e causa uma provocação intelectual. Essa provocação cria-nos dúvidas (?) e, por conseguinte, sentimo-nos compelidos a encontrar respostas por meio de estudos e da elaboração de mais questões.
Inicialmente, neste processo, começamos por imaginar fitas, lados, lados iguais ou diferentes num só objeto (uma só realidade) que se transforma num único lado, numa única borda. Porquê? Um só universo, várias realidades… E o infinito? Também está lá, mesmo visualmente a Fita de Möbius parece-se com o símbolo universal do infinito (coincidência?…). Uno e infinito? ∞
Logo de seguida, conhecimento, inteligência, imaginação colocam-se numa ação concertada e surge uma tentativa de entendimento, algo que possa ser uma base de partida para que se faça alguma luz. Pode-se pensar, por analogia, que os lados representam realidades visíveis que nos são sensíveis ou, pelo menos, aquelas em que tomamos atenção, pois assume-se que pode haver uma infinidade delas. Isto parece-me intuitivo. Mas a Fita, pelo que nela acontece, intui-nos de que existe algo mais, algo inteligível, só acessível através da mente e da inteligência.
A fita em si, simples, colada ou não, com os dois lados é o material, visível e sensível, ou seja, o exemplo de uma (ou mais) realidades mas… A Fita, por sua vez, mostra mais do que isto, mostra que nós, humanos, existimos para descobrir o que pode estar para além do que os nossos olhos podem ver e, ao fazermos isso, acabamos também por nos vermos a nós mesmos. Somos nós que damos a meia-volta.
Pode-se intuir, então, que a Fita nos dá um vislumbre de que existe uma outra dimensão e que, na verdade, essa dimensão rege a nossa. Desta forma, por aqui, pode-se fazer um paralelismo com os ensinamentos de Platão, fazendo assim uma ponte entre a Fita de Möbius e a Filosofia. A Fita apresenta-nos a dualidade do universo e uma forma como podemos entender e aceder a outra dimensão. Ao dar esta meia-volta estamos, por contraste, a criar consciência.
Tal como acontece quando nos viramos para nós próprios, dando assim início a um processo de autoconhecimento que nos permite chegar mais perto da nossa essência, aumentar a nossa consciência sobre nós, sobre os outros e o mundo que nos rodeia.
Mas podemos “divagar filosoficamente” e dar alguns exemplos, pois o assunto é vasto e tem muito por explorar.
Pensemos no Tempo, largamente abordado em Filosofia. Imaginemos que numa fita, num dos lados, o tempo “avança” e no outro, o tempo “recua”. Ao unirmos as extremidades sem a meia-volta, verifica-se que, de um lado e do outro da fita, o sentido (que pode ser aqui entendido como direção) do tempo não se altera e é circular “ad aeternum”.
Ou seja, pode-se pensar que existem duas realidades com sentidos de tempo opostos mas, na verdade, estes sentidos são aparentes, pois se observarmos cada lado isoladamente, o sentido não muda, é sempre o mesmo, o que quer dizer que o tempo é só um e, como já se disse, sem princípio nem fim. Isto acontece, quer de um lado quer do outro da fita, pelo que além de haver um só tempo, o seu sentido – se avança ou recua – é uma falsa questão. Trata-se de uma ilusão, pois depende somente do referencial que somos nós, nós é que o “vemos” assim. Nesta conceção, viveríamos num universo “circular” e uni-temporal (e tudo se repetiria infinitamente?).
Já com a meia-volta, os sentidos ora colidem, ora afastam-se, num único lado! Este será o lado Uno, aquele que rege e não os lados (entenda-se realidades) que nos são concretos e sensíveis. Também aqui o tempo parece ser um só.
Qual o significado deste facto? Será que corrobora a teoria de que o universo tem dois estados de espaço-tempo – um de expansão logo a seguir ao “big bang” para, em algum momento, passar a contrair-se até se tornar um ponto minúsculo e depois voltar a expandir-se e assim continuar num vai-e-vem “ad aeternum”? Aliás, se repararmos, o movimento de vaivém, de fluxo, é um sinal universal de vida.
Encontramo-lo no nosso planeta e no universo, sentimo-lo literalmente no bater do nosso coração! Nesta conceção, viveríamos num universo com início e fim onde tudo recomeçaria vezes sem conta, mas de forma diferente. Para mim, faz mais sentido que assim seja, pois isso dá sentido a tudo o que é consciente, o que é vivo.
A Fita de Möbius pode ser usada como metáfora para explicar filosoficamente o mundo e o universo. Pensemos num outro conceito inerente à vida humana: a Justiça (ou o Bem, por ex.). O que é e onde está a Justiça? Será algo que está dentro ou fora do homem? Num lado ou no outro da fita? Ao fazer a Fita de Möbius percebemos, de acordo com o teorizado, que a Justiça está no único lado da Fita, ou seja, nem está dentro nem está fora do homem, está numa dimensão que considera “o dentro e o fora” do homem, ao mesmo tempo. Por outras palavras, a justiça que está dentro do homem e a que está fora do homem é a mesma, somente tem de ser por ele encontrada. O lado da Fita de Möbius tem de ser criado para ser encontrado. É isso que o homem, o filósofo, faz.
Esta meia-volta da Fita cria o contraste que gera a consciência. Este contraste ilumina-nos e conduz-nos ao encontro dos arquétipos, das verdadeiras realidades eternas, para dar mais uma vez o sentido platónico. Os lados de uma fita propriamente dita seriam as sombras e o lado da Fita de Möbius será a luz.
A seguir, para finalizar, apresento uma imagen de uma Fita de Möbius que produzi e fotografei com o objetivo de realçar, não os aspetos construtivos e estruturais da Fita mas sim a sua beleza.