A combinação de qualquer zero consigo mesmo, ou, por outras palavras, da unidade infinita e o zero da categoria de quantidade anterior consigo mesmo, pode ser efectuada de infinitos modos, seja no amplo espaço ou no espaço metafísico, e cada uma destas formas tem outra exactamente igual colocada simetricamente. Para além destas duplas de combinações infinitas, existe uma combinação muito especial, que não tem outra combinação igual e oposto simétrico, que não tem duplo, que é única, que é a unidade, que é um uno pitagórico e que é a perfeição absoluta dentro do tipo de combinações de que vamos tratar.
Exemplos — O zero da extensão, o ponto inextenso na posição A combinando consigo mesmo na posição B, origina a relação entre as posições A e B numa infinidade de formas, porque infinitos caminhos ou linhas podem prosseguir para iniciar o movimento em A e concluir o movimento em B. Podemos caminhar ao longo de um polígono de dois lados, de três, de quatro, de inúmeros lados iguais ou desiguais. Podemos seguir um arco de uma circunferência, de uma elipse, de uma hipérbole, de uma parábola. Podemos seguir inúmeras linhas curvas regulares ou irregulares. A cada uma destas linhas ou caminhos, para ir de A a B, corresponde outra figura geométrica exactamente igual, e colocados simetricamente em relação aos pontos A e B, no plano em que supomos que estas figuras e os pontos A e B devem ser colocados, e em cada um dos infinitos planos que passam pelos pontos A e B.
Em cada um dos planos infinitos e em cada uma das superfícies infinitas que passam pelos pontos A e B, haverá sempre linhas infinitas duplas e simétricas para relacionar os pontos inextensos A e B. Mas, ao mesmo tempo, e no meio desta dualidade infinita, existe uma relação muito especial, única, que por não ter duplo possível, é a mais perfeita de todas as relações possíveis: a linha recta. Esta representação única, é a unidade. A linha recta é a unidade da quantidade linha; é a perfeição absoluta dentro da quantidade linha.
Ao definir a linha recta pela curta, detemo-nos no detalhe e deixamos a essência, porque o essencial na linha recta é ser uma combinação única, o ser da unidade. O ser mais diminuto obedece ao princípio da menor acção, que é uma consequência ou atributo da unidade.
Esta verdade da geometria elementar ou mais simples, também é verdadeira na geometria mais complexa ou geometria de categoria de regularidade mais elevada, e, em geral, em todas as categorias possíveis da geometria.
Em vez de considerarmos um ponto matemático inextenso movendo-se de uma posição diferente para a outra no tempo e no espaço, consideremos um ponto mais complexo, o homem movendo-se de um instante da sua vida para um instante posterior.
Esse movimento, ou seja, a conduta física, intelectual ou moral que o homem segue, pode-se realizar de infinitos modos, entregues à sua livre escolha, e que são todos duplos e simétricos. Só há um que não tem duplo, a recta metafísica do bem, que é única, que é perfeita e bela, porque a perfeição, a regularidade, a simetria, o equilíbrio e a beleza são vários aspectos e atributos da unidade, da combinação única.
Ao falar, podemos fazê-lo em voz muito alta ou muito baixa. Há apenas um modo único de falar: nem muito alto nem muito suave, que é o que elege aquele que tem a arte da palavra.
Ao caminhar podemos fazê-lo de forma presunçosa e afectada ou arrastando os pés e com movimentos desajeitados. Só existe uma forma única de andar: aquela que, por exemplo, elegido por uma mulher discreta, graciosa e elegante, em todos os momentos.
Ao nos defendermos de uma agressão, podemos fugir covardemente ou dar a morte cruel e imediata ao nosso agressor. Só existe uma forma única, perfeita e bela, e portanto, certa: a de rejeitar o ataque, causando o menor dano possível ao nosso agressor.
Agir bem é escolher em cada momento da nossa vida o acto físico, intelectual ou moral que é mais perfeito e que, portanto, é o mais adequado, em relação a todos os outros, naquele momento. Ao executar o dito acto, escolhendo entre as infinitas formas duplas de realizar o único que não tem duplo, nele encontraremos a simetria, o equilíbrio, a beleza, o bem, a perfeição absoluta dentro das circunstâncias relativas ou condicionantes da combinação.
Em suma: o bem é uma linha recta metafísica traçada entre dois instantes da nossa vida. Uma linha recta de geometria transcendental, na qual a perfeição absoluta da divindade pode comparar-se a um espaço metafísico inextenso com uma esfera metafísica, lugar de todas as infinitas combinações possíveis com a recta do bem.
Movamos uma linha recta poligonal ou curva, de todas as maneiras possíveis. Da combinação de cada linha consigo mesma, resultam superfícies infinitas, todas duplas, porque a cada linha corresponde necessariamente outra superfície simétrica ou conjugada.
Dentro da infinita dualidade das superfícies duplas originadas pelo movimento das linhas curvas e poligonais, existem combinações únicas sem duplo, que são superfícies regulares, limites de todas as superfícies irregulares possíveis. Dentro da infinita dualidade das superfícies reguladas há apenas uma superfície, única: a superfície plana.
O plano é a unidade da quantidade superfície, a perfeição absoluta dentro desta categoria de quantidade, e resulta do movimento de uma linha em redor de outra, em que ambas permanecem constantemente em posição perpendicular, em cruz, na forma de uno pitagórico.
Movamos dois planos ou, que é a igual, combinemos um plano consigo mesmo. Resultam infinitas posições duplas e apenas uma sem par; aquela em que se cortam perpendicularmente, em cruz!
O movimento de três planos também oferece, entre infinitas combinações duplas, apenas uma sem duplo: aquela em que se cortam perpendicularmente dois a dois, também em cruz!
A combinação de quatro planos gera o tetraedro, a forma elementar do volume. A cada posição dos quatro vértices corresponde outra simétrica.
Entre os infinitos duplos de tetraedros possíveis, há apenas um tetraedro que não tem duplo, o tetraedro regular, que é a unidade da quantidade volume, a perfeição absoluta dos volumes.
Segundo o critério pitagórico, cada unidade deriva da combinação harmoniosa, perfeita ou regular de outra unidade consecutiva ou mais simples, consigo mesma. Portanto, todas as unidades consecutivas, todas as formas da Natureza, serão combinações regulares do tetraedro regular.
Combinando dois tetraedros regulares iguais, observamos que entre a infinidade de posições duplas possíveis existe uma sem duplo. É aquela em que, coincidindo com seus centros, as arestas se cruzam perpendicularmente. Esta nova unidade é o beta tetraedro regular, cujos vértices externos geram o cubo e cujos vértices internos geram o octaedro.
Combinando um cubo com um octaedro de tamanho adequado, de modo que os respectivos centros coincidam e as suas arestas se cruzem perpendicularmente no ponto médio, numa cruz!, convertem-se as arestas do cubo e do octaedro em diagonais de um losango, do mesmo modo que as arestas do tetraedro se convertem em diagonais das faces do cubo, surgindo uma nova espécie de formas superiores, uma nova unidade. o dodecaedro rômbico regular.
Combinando cinco tetraedros regulares, de modo que seus centros coincidam e seus vértices estejam o mais distantes possível, resultam duas figuras simétricas: o pentatetraedro “dextrorsun” do lado direito e o pentatetraedro “sinistrorsum” lado esquerdo. Em ambos os vértices externos originam o dodecaedro. e os vértices interiores do icosaedro.
Combinando essas duas figuras opostas e simétricas, de modo que os seus centros e seus vértices coincidam, e as arestas de uma cortem perpendicularmente as da outra, numa cruz, resulta uma combinação única ou sem dualidade, de dez tetraedros regulares iguais, a década pitagórica, que eu denominei, ao descobri-la, pentatetraedro duplo, unidade superior na hierarquia das formas, que precede à unidade tetraedro ou tétrada.
O tetraedro é o número quatro, em relação à unidade do átomo, e o número um ou unidade em relação à década. Daí a excepcional importância que os pitagóricos davam aos números 1, 4 e 10.
Combinando um dodecaedro com um icosaedro de tamanho adequado, de modo que quando os seus centros coincidem, as suas arestas se cruzem, em cruz, nos seus pontos médios, surge uma espécie superior de formas, um poliedro de 30 faces rômbicas que me permito batizar com o nome grego que indicou o meu saudoso amigo.
D. Eduardo Benot: o triacontaedro. Ofereci ao Ateneu de Madrid o primeiro triacontaedro rombóico regular inventado e composto por mim. A lei das diagonais, talvez desconhecida dos antigos, é uma lei muito importante na génese das formas, pois representa a união entre a geometria e a mecânica.
A lei da cruz, que é a própria essência da unidade, era indubitavelmente conhecida dos antigos, e sendo a figura geométrica da cruz, um símbolo abreviado da gênese das formas, é possível que tenha servido como um sinal para se reconhecer os iniciados nos segredos elevados da religião, da ciência e da política, quando estes eram herança secreta de muito poucos. Da mesma forma que a pentalfa (pentágono, estrela regular, figura abreviado da face do penta hexaedro, outra década pitagórica descoberta por mim, composta por 5 cubos e, portanto, por 10 tetraedros), servia para se reconhecer os iniciados às doutrinas secretas do pitagorismo.
Supomos que, a ideia e a importância da cruz nas diferentes religiões, tenham como base geométrica o cruzamento de planos e linhas na posição única de perpendicularidade, como símbolo da perfeição absoluta da unidade e da divindade.
Em virtude de uma indução muito legítima, os pitagóricos supunham que todas as outras formas da Natureza eram combinações da década, e por isso diziam sem dúvida que cada número era decádico.
Eu também assim creio, mas dando mais abrangência à combinação dos sete sólidos regulares convexos, de faces iguais, igualmente inclinadas entre si: tetraedro, cubo, octaedro, dodecaedro, icosaedro, dodecaedro rômbico e triacontaedro rômbico, consigo mesmos e entre si, ou seja, não limitando as combinações exclusivamente à década.
A linha (reta ou não recta) também é o infinito da quantidade ponto, e também o zero da quantidade superfície.
Esta trindade de formas, em virtude da qual qualquer forma é simultaneamente zero de uma categoria de quantidade, infinito de outra categoria de quantidade e unidade distinta das anteriores, contém a chave para ler em profundidade no grande livro do mundo invisível e do mundo visível.
Genericamente podemos definir a unidade como: A unidade de uma classe de quantidade é, entre as infinitas combinações duplas possíveis do respectivo zero consigo mesmo, a única que não é dupla e, por isso, a combinação mais perfeita de todas, a única completamente regular, equilibrada, bela e boa.
Referir-se à unidade é o mesmo que referir-se à regularidade, simetria, perfeição, beleza, bem e linha recta de uma determinada categoria de geometria, combinação única dentro de um determinado tipo de combinações. São todos termos equivalentes, para nos referirmos a uma única coisa que vislumbramos confusamente, e que podemos expressar com relativa clareza, enunciando: a combinação de dois ou mais infinitos de uma determinada categoria ou a combinação de dois ou mais zeros, uma vez que já dissemos que a infinito de uma quantidade é o zero da quantidade consecutiva, pode ser efetuada em infinitos modos duplos de sexualidade oposta, em duplos ou em sizígias, opostos e contrários. Há apenas um modo único de combinação em que não há duplo, em que se uniu e misturou termos opostos e contrários, em que as duas sexualidades de todas as formas se misturam para formar a espécie.
A unidade é aquela combinação de infinitos que serve de fronteira, que une e limita ao mesmo tempo a dualidade das infinitas combinações possíveis.
A unidade é a perfeição absoluta dentro de cada categoria de quantidade, o zero dela mesma em movimento da única forma perfeita possível.
Entre as combinações duplas há dois tipos de dualidade: uma de imperfeição ou relativa irregularidade, e dentro desta imperfeição relativa há uma combinação que é completamente regular, perfeita e única dentro do grau de imperfeição que observarmos.
Exemplos. — A linha recta, como vimos, é a perfeição absoluta que liga dois pontos: A e B.
Se os juntarmos recorrendo a um polígono de dois lados, ou seja, por duas rectas que passam por um terceiro ponto C, a solução mais perfeita de todas (dentro da imperfeição relativa assumida) é a de um triângulo equilátero, limite de uma infinidade de triângulos isósceles internos ao triângulo A, B, C, e outra infinidade de triângulos isósceles externos ao triângulo A, B, C.
Da mesma forma, cada triângulo isósceles é uma forma relativamente perfeita, a forma limite de uma infinidade de triângulos escalenos, irregulares, internos e de outra infinidade de triângulos irregulares externos.
Se ligarmos os pontos A e B por meio de um polígono de n lados, quando estes são iguais, o polígono é o mais perfeito possível. É um polígono limite de uma infinidade de polígonos irregulares internos e de outra infinidade de polígonos irregulares externos.
Se as juntarmos por meio de curvas, as secções cónicas são formas relativamente perfeitas, limites de uma infinidade de curvas internas menos perfeitas e outra infinidade de curvas externas menos perfeitas.
De tal forma a que, entre as infinitas formas de ligar dois pontos, A e B, ou seja, de combinar um ponto consigo mesmo, há apenas uma que é a perfeição absoluta, e entre as outras infinitas formas imperfeitas há uma série de arquétipos de perfeição relativa, cada um dos quais é uma unidade de perfeição absoluta, como limite que é, das formas menos regulares incluídas no grau de perfeição imediatamente abaixo. Significa que, entre a perfeição absoluta e a imperfeição absoluta, ou seja, entre o infinito da perfeição e o zero da perfeição, há uma série ordenada de perfeições relativas, de unos pitagóricos, de números, de arquétipos de perfeição que servem como limites de todas as formas imperfeitas possíveis. Os pessimistas vêem apenas estas últimas, não vêem a unidade.
A definição de unidade, já mencionada, é também um guia muito seguro para percorrer o labirinto das infinitas categorias de quantidade que o mundo nos oferece e distingui-las umas das outras, averiguando qual é a unidade de cada uma, o uno pitagórico que expressa a máxima perfeição em cada categoria de formas.
Suponhamos, por exemplo, que queremos descobrir que novas categorias de quantidades originam a combinação da linha recta consigo mesma e quais são as respectivas unidades.
Para isso, basta examinar quais são as combinações possíveis e escolher, em cada categoria de combinações, a mais regular e equilibrada, a única que não tem dualidade, a mais perfeita, e que será a unidade.
Uma linha A_______B de comprimento dado, combina consigo mesma num plano, ou, o que é o mesmo, em duas posições diferentes dessa linha, formando uma infinidade de quadriláteros, de combinações de quatro pontos.
Pois bem, o losango de lados iguais é uma forma limite de todos os quadriláteros irregulares possíveis. Dentro da única forma regular perfeita equilibrada do losango de lados iguais, há uma infinidade de losangos possíveis, cujo limite é o quadrado.
Além disso, se as duas posições da recta A_______B têm o ponto A em comum e o ponto B na sua nova posição, que se encontra à mesma distância tanto da primeira posição quanto do ponto A, resulta o triângulo equilátero, como um caso particular do losango e do quadrado, e como forma limite das combinações possíveis num plano de duas rectas iguais, ou de uma recta consigo mesma, e como forma limite dos triângulos escalenos.
Se colocarmos as rectas de modo que não fiquem no mesmo plano, há infinitos duplos de tetraedros irregulares interiores e exteriores e um único tetraedro sem duplo: o tetraedro regular, aquele em que as duas rectas se cruzam, embora sem tocar.
Ou seja, a combinação de uma linha recta de dado comprimento consigo mesma, gerou quatro novas categorias de quantidade, cujas respectivas unidades são o triângulo equilátero, o losango de lados iguais, o quadrado e, por último, o tetraedro regular.
Em resumo: entre as infinitas combinações possíveis de duas rectas, ou seja, do zero da extensão da superfície consigo mesma, há uma que é a perfeição absoluta, a unidade por excelência dessa categoria de quantidade, e há outros unos, outras unidades de perfeição relativa, o triângulo equilátero, o losango e o quadrado que são esboços ou formas embrionárias do tetraedro regular, que potencialmente contém o tetraedro regular.
Na resolução, tudo o que examinamos é simultaneamente zero, infinito e unidade. É uma forma trina, algo como uma hipóstase de três categorias de quantidade diferentes, intimamente unidas pelo vínculo muito forte da lei combinatória.
Portanto, é indiferente considerar a série indefinida de categorias de quantidade, a série de rectas horizontais da tábua pitagórica como uma série de zeros ou como uma série de infinitos, ou como uma série de unos à maneira pitagórica, ou como a repetição constante, numa infinita variedade de tons, das três notas fundamentais de todas as coisas possíveis: zero, unidade e infinito.
Todas as coisas que a Natureza nos mostra e todas as ideias que consideramos dentro do espaço metafísico inextenso, são unos pitagóricos, são perfeições absolutas e relativas, são unidades, porque a unidade é demarcação fatal e necessária da lei combinatória, como resultado de uma espécie de selecção darwiniana, que se realiza tanto na Natureza como no mundo anterior das ideias.
Claro que, se é difícil especificar a transição de uma espécie para outra em substâncias químicas, vegetais ou animais, é muito mais difícil ainda se tentarmos estabelecer a evolução de uma espécie metafísica para outra. Mas esta evolução é certa, inquestionável, e pode ser comprovado em muitos casos que nas transformações de espécies metafísicas acontece a mesma coisa que com as espécies materiais, nomeadamente, que a combinação regular de uma espécie com ela própria concebe outras espécies superiores.
Esta é, na nossa opinião, o colossal mérito de Pitágoras, em ter visto e esclarecido o processo evolutivo e transformador, tanto no mundo visível como no invisível, do qual resulta que Darwin, o Deus ou demiurgo da ciência moderna, nada mais é do que uma cópia má e mal desenhada de Pitágoras, sem que por isto pretendamos negar os seus méritos extraordinários e indiscutíveis.
Continue a ler a 2ª parte deste artigo: Génese da Unidade – 2ª parte
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