Este artigo baseia-se na obra A Doutrina Secreta Volume I, Cosmogênese, de H.P. Blavatsky.
Ante os olhos da escritora está um manuscrito arcaico, uma coleção de folhas de palma que se tornaram impermeáveis à água e imunes à ação do fogo e do ar, por algum processo específico desconhecido. Vê-se na primeira página um disco de brancura sem mácula, destacando-se sobre fundo de um negro intenso. Na página seguinte aparece o mesmo disco, mas com um ponto no centro. O primeiro (sabem todos aqueles que se dedicam a estes estudos) representa o Cosmos na Eternidade, antes do despertar da Energia ainda em repouso, a emanação do Verbo em sistemas posteriores. O ponto no círculo, até então imaculado, Espaço e Eternidade em Pralaya, indica a aurora da diferenciação. É o ponto dentro do Ovo do Mundo, o germe interno de onde se desenvolverá o Universo, o Todo, o Cosmos infinito e periódico; germe que é latente e ativo, revezando-se periodicamente os dois estados. O único círculo é a Unidade Divina, de onde tudo procede e para onde tudo retorna: sua circunferência, símbolo forçosamente limitado, porque limitada é a mente humana, indica a PRESENÇA abstrata e sempre incognoscível, e seu plano, a Alma Universal, embora os dois sejam um. Sendo branca a superfície do disco e negro todo o fundo que o rodeia, isso mostra que esse plano é o único conhecimento, não obstante ainda obscuro e nebuloso, que ao homem é dado alcançar. No plano têm origem as manifestações manvantáricas, porque é naquela ALMA que, durante o Pralaya, dorme o Pensamento Divino122, no qual jaz oculto o plano de todas as cosmogonias e teogonias futuras.
122 Quase não é necessário recordar ao leitor que as expressões Pensamento Divino e Mente
A Doutrina Secreta, Volume I, Cosmogênese, pág. 108-109, de H.P. Blavatsky.
Ed. Pensamento
O universo pode ser visto como um grande ser vivo composto por outros seres. No Antigo Egipto, esta ideia era expressa pela deusa Hathor, representada sob a forma de uma vaca, com os seus órgãos, aparelhos e sistemas, que, sendo muitos, possuem, no entanto, uma unidade.
Este ser está sujeito a períodos de vigília (chamados Manvantaras na filosofia hindu) e períodos de sono (chamados Pralayas na dita filosofia). Ou seja, períodos de atividade ou de multiplicidade e períodos de repouso ou de absorção dessa multiplicidade.
Durante o Pralaya, o Kosmos na Eternidade, a Unidade Divina, a Divindade Absoluta não manifestada e, no entanto, Real, é representada por um círculo branco sobre um fundo preto.
Quando o Manvantara está prestes a começar, um ponto aparece no centro. Esse é o primeiro sinal de que a diferenciação está prestes a começar, ainda sem dimensão, pelo menos tal como a conhecemos. É a primeira singularidade, a origem das singularidades posteriores (linhas, figuras geométricas, corpos).
mente humana percebe uma circunferência limitadora, porque ela própria é limitada, enquanto a Unidade Absoluta é ilimitada. Essa circunferência, porém, indica-nos a PRESENÇA dessa Divindade e seu plano, a Alma Universal, que vem a ser a mesma.
O ser humano está no mundo da polaridade (preto/branco) e por isso não pode alcançar a essência das coisas.
Na Alma Universal esconde-se o projeto de todos os universos futuros compostos por aquilo a que chamamos seres vivos, sendo esta Alma mais viva, se possível, do que todos estes seres.
O Catecismo Oculto contém as seguintes perguntas e respostas:
Que é aquilo que sempre é? — O Espaço, o eterno Anupâdaka (que não tem pais).
Que é aquilo que sempre foi? — O Germe na Raiz.
Que ê aquilo que sem cessar vai e vem? — É o Grande Alento.
Então há três Eternos? — Não, os três são um. — O que sempre é, é um; o que sempre foi, é um; o que sempre está sendo e vindo a ser, é também um; e este é o Espaço.
Explica, ó Lanu! (discípulo) — O Uno é um Círculo não interrompido (Anel) e sem circunferência, porque não está em parte alguma e está em toda parte; o Uno é o Plano sem limites do Círculo, que manifesta um Diâmetro somente durante os períodos manvantáricos; o Uno é o Ponto indivisível que não está situado em parte alguma, e percebido em toda parte durante aqueles períodos. É a Vertical e a Horizontal, o Pai e a Mãe, a cúspide e a base do Pai, as duas extremidades da Mãe, que em realidade não chegam a parte alguma; porque o Uno é o Anel, como também os Anéis que estão dentro desse Anel. É a Luz nas Trevas, e as Trevas na Luz: “o Alento que é eterno”.
Atua de fora para dentro, quando está em toda parte, e de dentro para fora, quando não está em parte alguma — ou seja, Mâyâ138, um dos centros139. Expande-se (expiração e inspiração). Quando se expande, a Mãe se difunde e se dispersa; quando se contrai, a Mãe se encolhe e se concentra. Assim se produzem os períodos de Evolução e de Dissolução, Manvantara e Pradaya. O Germe é indivisível e ígneo; a Raiz (o plano do Círculo) é fria; mas durante a Evolução e o Manvantara, o seu revestimento é frio e radiante. O Alento quente é o Pai que devora a progênie dos Elementos de múltiplas faces (heterogêneos) e deixa os que têm uma só face (homogêneos). O Alento frio é a Mãe que os concebe, que os forma, que os faz nascer e que os recolhe novamente em seu seio para tornar a formá-los outra vez na Aurora (do Dia de Brahmâ, ou Manvantara).
138 A filosofia esotérica, considerando como Mâyâ (ou a ilusão da ignorância) todas as coisas finitas, deve necessariamente olhar do mesmo modo todos os corpos e planetas intracósmicos, porque representam algo organizado e, portanto, finito. Assim, a expressão “atua de fora para dentro, etc.” se refere, na primeira parte, à aurora do Mahâmanvantara, ou grande revolução após uma das completas dissoluções periódicas de todas as formas compostas da natureza, em sua última essência ou elemento, do planeta à molécula; e, na segunda parte, ao Manvantara parcial ou local, que pode ser solar ou somente planetário.
139 Por “centro” aqui se entende um centro de energia ou foco cósmico. Quando a chamada “Criação“, ou formação de um planeta, é realizada por esta força que os Ocultistas designam como Vida, e a Ciência como Energia, então se dá o processo de dentro pata fora, tendo em vista que todos os átomos contêm em si mesmos a energia criadora do Alento divino. Assim é que — enquanto, depois de um Pralaya Absoluto, quando o material preexistente consiste em só Um Elemento, e o Alento “está em toda parte“, este último atua de fora para dentro — depois de um Pralaya menor, havendo tudo permanecido em statu quo (um estado de resfriamento, por assim dizer, como a Lua), ao primeiro estremecimento do Manvantara o planeta ou os planetas começam o seu retorno à vida, de dentro para fora.
A Doutrina Secreta, Volume I, Cosmogênese, pág. 121-122, de H.P. Blavatsky. Ed. Pensamento
O Absoluto ou Divindade Una é composto por uma Tríade, facto que aparece em todas as religiões, mas esta Tríade possui unidade; poderíamos representá-la por um triângulo, que, sendo uno, possui três vértices equivalentes, que podem ser inscritos num círculo. Esta Tríade sempre foi, sempre é, sempre será e será una, dentro de um círculo ininterrupto e sem qualquer circunferência, pois não está em parte alguma e está em todo o lado.
O Um é o Ponto indivisível (o Pai ou a Mãe), que se move no início do período de manifestação, formando a linha horizontal (a Mãe). E, a partir dela, com novos movimentos, o ponto forma o diâmetro vertical (o Pai). Como estes dois diâmetros estão dentro do círculo e não satisfazem uma relação exacta com ele, produz-se uma torção, quebrando os pontos de união dos diâmetros com o círculo e elevando os seus pedaços para formar dois triângulos entrelaçados (o triângulo é o Filho). A partir deste ponto, todas as figuras geométricas e corpos em volume aparecem por combinação.
O ponto é o “Sopro que é eterno”, que se estende e se contrai. Quando se estende, a Mãe difunde-se e espalha-se; quando se contrai, a Mãe recua e retira-se. Isto produz os Manvantaras e os Pralayas.
O Sopro quente é o Pai, que tende para a unidade homogénea e para a dissolução dos elementos materiais. O Sopro frio é a Mãe, que expande a multiplicidade e a reúne novamente na unidade para formá-la novamente num novo Manvantara ou período de manifestação.
Em seu modo de ser absoluto, o Princípio Uno, sob seus dois aspetos, Parabrahman e Mûlaprakriti, não tem sexo, é incondicionado e eterno. Sua emanação manvantárica, periódica, ou irradiação primária, é também una, andrógina, e finita em seu aspeto fenomenal. Quando, por sua vez, a emanação irradia, todos os seus raios são igualmente andróginos, convertendo-se nos princípios masculino e feminino em seus aspetos inferiores. Depois de um Pralaya, quer seja o Grande Pralaya ou o Pralaya Menor — deixando este último os mundos em statu quo149 — o primeiro a despertar para a vida ativa é o plástico Âkâsha, o Pai-Mãe, o Espírito e a Alma do Éter, ou seja, o Plano do Círculo. O Espaço é chamado a Mãe, antes de sua atividade cósmica, e Pai-Mãe no primeiro estágio do seu despertar.
149 Não são os organismos físicos, e muito menos os seus princípios psíquicos, o que permanece em Statu quo durante os grandes Pralayas cósmicos ou mesmo solares, e sim unicamente suas “fotografias”. âkâshicas ou astrais. Mas, durante os Pralayas Menores, os planetas, uma vez envolvidos pela “Noite”, continuam intatos, apesar de mortos, à maneira de um grande animal que, preso e sepultado nos gelos polares, assim se conserva durante largos períodos.
A Doutrina Secreta, Volume I, Cosmogênese, pág. 130-131, de H.P. Blavatsky. Ed. Pensamento
O Princípio Uno pode ser visto como Parabrahman (o Pai) ou como Mûlaprakriti (a Mãe), uma vez que não há polaridade nele. A sua irradiação primária integra a polaridade dentro de si, embora ainda não separada. Essa polaridade está separada nos seus aspetos inferiores.
Depois de um Pralaya, ou período de não-manifestação, é o Pai-Mãe (Âkâsha), a polaridade integrada, não separada, isto é, o Plano do Círculo, que primeiro desperta para a vida ativa.
O Espaço (O Círculo) é chamado a Mãe, antes da sua atividade cósmica, e o Pai-Mãe (Plano do Círculo) na primeira fase do seu despertar.
Nesta fase do despertar do Universo, o simbolismo sagrado representa-o como um Círculo perfeito com o Ponto (Raiz) no centro.
O “Círculo sem Limites“, o Zero, passa a ser um número somente quando um dos outros nove algarismos o precede, manifestando assim o seu valor e potência; o “Verbo” ou Logos em união com a “Voz” e o Espírito283 (a expressão e origem da consciência) representa os nove algarismos, e forma com o zero, a década, que contém em si todo o Universo. A Tríade forma dentro do círculo a Tetraktys ou o “Quatro Sagrado“, sendo o Quadrado inscrito no Círculo a mais poderosa de todas as figuras mágicas.
283 Refere-se isto ao Pensamento Abstrato e à Voz concreta, ou manifestação daquele, o efeito da causa.
A Doutrina Secreta, Volume I, Cosmogênese, pág. 237, de H.P. Blavatsky. Ed. Pensamento
O “Círculo Sem Limite” corresponde ao Zero, o não-número ou número por excelência, ou seja, a Divindade Una e Absoluta, o Todo Espiritual-nada material, que só exerce o seu poder criador quando surgem os restantes números, ou seja, quando surge a manifestação.
A Divindade Una e Absoluta exprime-se através de uma tríade, como vimos acima (Espírito, Voz, Logos, ou seja, 1,2,3), que juntamente com a sua origem (0) forma o Quatro Sagrado. Esta tríade reflete-se na Mente Cósmica, dando origem ao 4 material, ou seja, ao aparecimento do mundo manifestado, que já possui os dez números, uma vez que 1+2+3+4 = 10. Aqui os números são Ideias, Seres, e não simplesmente grafias como normalmente pensamos no nosso quotidiano.
Em todas as nações o Círculo era o símbolo do Desconhecido — o “Espaço Sem Limites“, o aspeto abstrato de uma abstração sempre presente —, a Divindade Incognoscível. Ele representa o Tempo sem limites na Eternidade.
(…)
Não se pode dar melhor definição do símbolo próprio e da natureza evidente da Divindade, a qual, tendo a sua circunferência em toda a parte (o ilimitado), tem, consequentemente, o seu ponto central também em toda a parte; ou, por outras palavras, se encontra em cada ponto do Universo.
“A causa primeira é o infinito ou ilimitado. Ela confere existência ao primeiro finito ou limitado.” [O Logos em sua manifestação e o Universo.] “O que produz um limite é análogo ao movimento.” [Veja-se Estância I supra.] “O limite produzido é um ponto, cuja essência é o movimento; mas, carecendo de partes, esta essência não é movimento efetivo, senão o seu connatus simplesmente.” [Em nossa Doutrina não é um connatus, mas uma transformação do que é Vibração Eterna no Não-Manifestado, do Movimento em vórtices no Mundo fenomenal ou manifestado.] “Daquele princípio procedem a expansão, o espaço, a forma e a sucessão ou tempo. Assim como em geometria um ponto gera uma linha, uma linha gera uma superfície, e a superfície um sólido, assim também o connatus do ponto tende para linhas, superfícies e sólidos. Em outras palavras, o Universo está contido in ovo no primeiro ponto natural.
O Movimento para o qual tende o connatus é circular, pois o círculo é a mais perfeita de todas as figuras… O mais perfeito gênero de movimento deve ser o movimento circular perpétuo; isto é, um movimento provindo do centro para a periferia, e da periferia para o centro322“.
322 Extraído de Principia Rerum Naturalium, de Emanuel Swedenborg.
A Doutrina Secreta, Volume I, Cosmogênese, pág. 257, 263-264, de H.P. Blavatsky. Ed. Pensamento
A causa de tudo o que é limitado é o ilimitado. O ponto central, inseparável, para a nossa mente, do conceito de círculo, efetua uma mudança da Vibração Eterna no imanifesto para o Movimento em vórtices no manifesto. Assim, o conatus do ponto, que tende para as linhas, superfícies e sólidos, torna-se movimento. Por outras palavras, o Universo está contido em gérmen no primeiro ponto natural, que através do seu movimento gera linhas, figuras geométricas e corpos com volume. Jorge Angel Livraga dá um exemplo muito ilustrativo deste facto no seu livro Introdução à Sabedoria do Oriente. Trata-se de acender um fósforo e submetê-lo a um movimento rápido, então parece-nos ver uma linha de fogo. Já temos a linha construída e, portanto, todas as outras figuras e corpos geométricos produzidos pelo movimento do ponto.
Assim, na alegoria, os Lipika separam o mundo (ou plano) do Espírito puro do mundo da Matéria. Os que “descem e sobem” (as Mônadas que encarnam e os homens que aspiram à purificação, “que sobem“, mas que ainda não alcançaram a meta) só poderão transpor o Círculo “Não Pássaras” quando chegar o Dia “Sê Conosco“: aquele dia em que o homem, libertando-se por si mesmo dos laços da ignorância, e reconhecendo plenamente a não separatividade do Ego que está dentro de sua Personalidade (erroneamente considerada como ele próprio), em relação ao Eu Universal (Anima Supra-Mundi), imerge na Essência Una para tornar-se não somente um “Conosco“, as Vidas universais manifestadas, que são uma Vida, mas esta mesma Vida.
(…)
Daí as expressões “O Dia do Vem a Nós“, “O Dia do Sê Conosco” etc. Assim como o Quadrado é o Símbolo das Quatro Forças ou Poderes sagrados — o Tetraktys, do mesmo modo o Círculo mostra o limite no seio do Infinito, que nenhum homem pode transpor, nem mesmo em espírito, como também nenhum Deva ou Dhyân Chohan. Os Espíritos dos que “descem e sobem“, durante o curso da evolução cíclica, só cruzarão o mundo “rodeado de ferro” no dia em que se acercarem do limiar de Paranirvana. Se o alcançarem, repousarão no seio de Parabrahman ou nas “Trevas Desconhecidas“, que para todos eles se tornarão em Luz, durante todo o período do Mahâpralaya, a “Grande Noite“, ou seja, durante os 311.040.000.000.000 anos de absorção em Brahman. O Dia do “Sê Conosco” é este período de Repouso, ou Paranirvana. Corresponde ao Dia do Juízo Final, que, infelizmente, tão materializado foi na religião dos cristãos355.
355 Para outras informações sobre esta expressão peculiar “o Dia do Sê Conosco”, veja-se também The Funerary Ritual of the Egyptians, pelo Visconde de Rougé.
A Doutrina Secreta, Volume I, Cosmogênese, pág. 283, 288-289, de H.P. Blavatsky. Ed. Pensamento
O Círculo manifesta também o limite, no seio do Infinito, que nenhum ser pode atravessar, nem mesmo em espírito, até ao dia em que atingir o limiar da perfeição. Se o atingir, repousará no seio de Parabrahman ou das “Trevas Desconhecidas”, que se tornarão para ele então, em Luz, durante todo o período do Mahâpralaya.
O que é a Luz Absoluta e o que é a Escuridão Absoluta? A mesma coisa. A Luz Absoluta espiritual é a Escuridão Absoluta material e vice-versa. Quando a Luz é muito intensa, não podemos ver nada, ficamos cegos.
Uma ideia semelhante à anterior é exposta por H.P. Blavatsky no seu livro A Voz do Silêncio quando diz que, depois de ter passado todas as suas provas e de ter reconhecido plenamente a não separação do Ego que está dentro da sua Personalidade do Eu Universal, o discípulo tornar-se-á A Gota no Oceano, a Faísca no Fogo. Da mesma forma, H. P. Blavatsky indica, no volume I de A Doutrina Secreta, que o ser humano participará da Unidade, será a Unidade, mas nunca se perderá como essência individual ou Paramârtha (Gota).
Mas, que é o Tiaou? As constantes alusões ao Tiaou no Livro dos Mortos encerram um mistério. Tiaou é o caminho do Sol noturno, o hemisfério inferior ou a região infernal dos egípcios, que estes situavam no lado oculto da lua. No Esoterismo deles, o ser humano saía da Lua (um tríplice mistério, astronômico, fisiológico e psíquico, a um só tempo), atravessava todo o ciclo da existência, e voltava depois ao lugar de seu nascimento, para dele sair outra vez. Via-se, por isso, o Defunto chegando ao Ocidente, sendo julgado perante Osíris, ressuscitando como o Deus Hórus e descrevendo círculos em torno dos céus siderais, o que é uma assimilação alegórica a Ra, o Sol; atravessando o Nut, o Abismo Celeste, e voltando mais uma vez a Tiaou — à semelhança de Osíris, que, como Deus da vida e da reprodução, reside na Lua. Plutarco492 apresenta os egípcios celebrando uma festa denominada “O Ingresso de Osíris na Lua“. No Ritual493‘ é prometida a vida depois da morte; e a renovação da vida é posta sob a proteção de Osíris-Lanu, porque a Lua era o símbolo da renovação da vida ou reencarnação, por causa de suas fases de crescente, minguante, desaparecimento e ressurgimento em cada mês. Está dito no Dankmoe494: “Oh! Osíris-Lunus! tu que refazes a tua primavera!” E Sabekh diz a Seti I495: “Tu te renovas a ti mesmo, como o Deus Lunus quando era criança.” Vê-se ainda mais claramente em um papiro do Louvre496: “Acasalamentos e concepções abundam quando ele (Osíris-Lunus) é visto nesse dia, nos céus.” Diz Osíris: “Oh! raio único e resplandecente da Lua! Eu saio das multidões (de estrelas) que giram em círculos…. Abre-me o Tisou, por Osíris N. Eu sairei de dia para a tarefa que tenho de fazer entre os vivos497“, ou seja, para dar lugar a concepções.
492 De Isidi et Osiride, XLIII.
493 Cap. XLI.
494 IV, 5.
495 Abydos, de Mariette, lâmina 51.
496 P. Pierret, Études Egyptologiques.
497 Ritual, cap. II.
A Doutrina Secreta, Volume I, Cosmogênese, pág. 434-435, de H.P. Blavatsky. Ed. Pensamento
Tiaou é o caminho do Sol Noturno, o caminho para o Reino do Mistério, do Invisível, do Espiritual. No esoterismo egípcio, o ser humano saiu da Lua, isto é, do Mundo da Sabedoria ou Celeste, atravessou todo o ciclo da existência material e regressou de novo ao Mundo Celeste antes de o deixar de novo para uma nova experiência. Assim, o Defunto é apresentado como chegando ao Mundo Invisível, sendo julgado perante Osíris, ressuscitando como o Deus Hórus e descrevendo círculos em torno dos céus siderais, o que é uma assimilação alegórica a Ra, o Sol, e nos diz que os caminhos a percorrer são os mesmos para todos os seres, são caminhos circulares.
O caminho circular reflete os ciclos evolutivos dos seres, sobretudo se os círculos estão dentro de uma espiral, formam uma espiral, porque isso permite ciclos encadeados na progressão, de modo que dentro de um ciclo evolutivo pode haver uma descida de nível. No entanto, o resultado do caminho em espiral é sempre ascendente, uma subida geralmente inclinada como a face de uma pirâmide, uma aproximação gradual ao Mundo Espiritual ou Mundo de Mistério.
Este percurso reflete-se a nível físico e energético no movimento dos astros, mas também pode ser observado no ser humano a nível psicológico e mental, após uma reflexão profunda. A lua, que também tem uma forma circular, pode ser um bom exemplo destes ciclos para nós.
Que é aquela “Centelha” que está suspensa da “Chama“? É Jiva, a Mônada em conjunção com Manas, ou melhor, com o aroma deste último, aquilo que sobrevive de cada Personalidade quando é meritória, e que pende de Âtmâ-Buddhi, a Chama, pelo Fio da Vida. De qualquer maneira, e seja qual for o número de princípios em que se divida o homem, fácil é demonstrar que esta doutrina era ensinada por todas as religiões antigas, desde a religião védica até a dos egípcios, desde a de Zoroastro até a dos judeus. Quanto a esta última, temos sobejas provas nas obras cabalísticas. Todo o sistema dos números cabalísticos se baseia no Setenário divino suspenso da Tríade (formando assim a Década), e nas suas permutações 7, 5, 4 e 3, que, finalmente, se fundem todas no próprio Um: o círculo infinito e sem limites.
A Doutrina Secreta, Volume I, Cosmogênese, pág. 450, de H.P. Blavatsky. Ed. Pensamento
O ser humano, como todos os seres, é constituído à imagem e semelhança da Divindade, geralmente composto por dez partes ou sete ou três, conforme a chave de interpretação e representada pelas figuras geométricas correspondentes (círculo, hexágono com um ponto central e triângulo). Tudo participa desses Seres-Ideias-Números, mas, em essência, tudo está dentro do Zero e de sua expressão: o Círculo sem Limite.
Ainda neste último fragmento, o Círculo infinito e ilimitado aparece como símbolo do Uno, do Deus Absoluto, uma Divindade Universal não relacionada e incondicionada.
Bibliografia:
Tomo I, Cosmogénesis, Doctrina Secreta de H.P. Blavatsky, S.T.E.*
Introducción a la Sabiduría de Oriente, Jorge Ángel Livraga Rizzi
La Voz del Silencio, H. P. Blavatsky
Observação: O presente artigo está originalmente no idioma espanhol. Na tradução para o português foi utiliza a versão A Doutrina Secreta, Volume I, Cosmogênese, de H.P. Blavatsky. Ed. Pensamento.
Imagem de capa
De Heikenwaelder Hugo, Austria, Email : heikenwaelder@aon.at, www.heikenwaelder.at – Universum, Grabado Flammarion (Paris, 1888). Ilustração que representa a observação do cosmos. Camille Flammarion (1842-1925).- L’atmosphère : météorologie populaire, Hachette, Paris, 1888, p. 163, CC BY-SA 2.5,