No artigo anterior estabelecemos o número cinco como o número do homem desperto.
Na figura do “Homem Vitruviano” de Leonardo Da Vinci, aquele que mantém os braços horizontais inscritos num quadrado, representa o Homem Quaternário, ou seja, o conjunto de estruturas ligadas a um eu ilusório. Não é mais que um animal inteligente.
O que torna o ser humano “divino”, ou seja, especial, é o aparecimento de um quinto elemento, um mistério dentro do mistério. Assim, devemos perguntar várias coisas: De onde vem esse quinto princípio? Qual é a sua origem e o seu propósito? É realmente parte do ser humano ou é algo imposto “desde cima”?
Mas antes de continuar gostaria de fazer uma consideração. Platão visava que as almas mais refinadas eram precisamente as mais fáceis de corromper.
Aquele que é um bruto, um homem muito primário, só responde aos instintos básicos, mas não pode ir além. É como uma pedra bruta. Alimente-o e ele ficará satisfeito tirando a sua soneca.
No entanto, o homem educado do século XXI, refinado em todos os tipos de costumes, alimentos, vestuário, etc., pode ser facilmente corrompido, seja pela fome, pela dor, pela desgraça, pela guerra. O seu próprio refinamento torna-o fraco frente às piores tentações e diante de seu próprio egoísmo desenfreado, filho da necessidade e do mandato de sobreviver a todo custo, será capaz de assassinatos em massa, do genocídio e das piores e refinadas aberrações que a mente humana pode conceber. E aqui chegamos ao cerne da questão: trata-se da mente humana, e enfatizo o humana, não é a mente animal mais ou menos desenvolvida nem a de um hipotético computador do futuro, mas a mente “especial” do ser humano.
E esta mente humana, quanto mais refinada for, mais fácil será corrompê-la e piores serão os seus crimes. Uma coisa muito diferente é ter uma mente educada no autocontrolo, nos valores éticos, na paciência diante da adversidade, colocando o bem dos outros antes de satisfazer os desejos próprios, e outra é ter uma mente refinada, sim, mas no vício, astuta para buscar a vantagem acima de qualquer valor ético. Esperta embora não inteligente, uma mente utilizada para dominar os outros, para conseguir tudo o que deseja à custa de quem é necessário para esse fim.
Então, o homem torna-se um lobo para o homem. A sua maior virtude, a inteligência, é usada na sua face obscura para depredar os outros.
Assim, temos por um lado a estrela de cinco pontas, com um vértice para cima, que representa a possibilidade de “salvação”, isto é, de “salus”, de que o homem possa viver verdadeiramente a sua imortalidade. Entre os gregos e romanos esta possibilidade também foi simbolizada em Hygeia (em grego Ὑγιεία), precisamente a deusa da “Saúde” e filha de Asclépio, o deus da medicina. E o seu símbolo, assim como o dos pitagóricos que “sau-davam” com seu nome, era a estrela de 5 pontas.
Mas como diz o ditado, “Daemon est Deus inversus“, isto é, “O Diabo é Deus invertido”. Essa brilhante faculdade de Prometeu, o Fogo da Mente concedido ao homem desde as regiões divinas, também tem seu reflexo inverso, assim a inteligência pura transforma-se em astúcia, em ser esperto para tirar vantagens sobre os outros, nas picardias, na astúcia, na artimanha, na dissimulação, na malícia. E então o pentagrama converte-se em satânico e maligno:
Toda a estrela-homem agora aponta para baixo, porque o quinto elemento verdadeiro já não existe, mas um que o substitui e o conduz ao abismo, é seu reflexo perverso, a mente destrutiva para si mesmo e para os outros.
Por esta razão, os símbolos e seus atores foram divididos em “os Bons“:
Em resumo, no “Deus Uno” interior, enquanto seus opostos e inversos são eles mesmos, mas no seu papel de “Maus”, e seus símbolos são:
Como podemos ver, são duas versões da mesma coisa. Dois pontos de vista, ou talvez duas fases na evolução do mesmo. Uma é a versão boa, aceita, ortodoxa e santificada, e a outra a versão condenada, especialmente por todos os deuses exotéricos e dogmáticos, e sobretudo pelos seus seguidores.
Sem entrar em mais detalhes, podemos entender por que razão o número 5 tem aquela natureza dupla que o torna desarmónico ou instável. Na verdade, trata-se do homem como ser mental e, coletivamente, de toda a humanidade, ou seja, os anjos rebeldes diante da passividade, aqueles que renunciaram a um céu de querubins porque queriam ser como o próprio Deus. E isso supõe o uso da experiência mental, que como sabemos oscila entre lógica, analisadora, calculista, fria e amoral, e analógica, moralizante, unificadora e divina. É também a marca alegórica de Caim, o pai de todas as civilizações e o grande assassino do inocente Abel que cada um carrega dentro de si.
Qualquer autêntico filósofo experimentou em si mesmo a condenação e rejeição de todos os bons pensadores, você mesmo que lê este texto certamente não será compreendido por muitos ao seu redor.
Qual é a lição de tudo isto? Bem, embora tenhamos recebido uma enorme oportunidade de descobrir e cultivar esse divino quinto princípio em nós, não devemos desperdiçá-la caindo na utilização egoísta, vaidosa e manipuladora do conhecimento.
Em “A Voz do Silêncio” traduzido por H.P. Blavatsky, adverte-se sobre o perigo da Iniciação. Diz-se que o discípulo passa por três salas: a da Ignorância, na qual a grande maioria nasce e morre, a da Instrução e, finalmente, o Limiar que nos leva à Sabedoria Ilimitada.
Por ser ignorante ninguém pode ser condenado, basta ter o que têm, sofrer seu próprio Karma sem saber por quê. Sabemos muito sobre isso. Mas quando acedemos à Sala de Instrução, ante os novos conhecimentos adquiridos, surgem a vaidade, a perfídia, o mau uso daqueles conhecimentos, entretendo-se neles sem qualquer propósito.
O nome da segunda Sala é o da Instrução. Nele a sua alma encontrará as flores da vida, mas sob cada flor há uma serpente enroscada.
“A Voz do Silêncio”
Acredito que não existe uma fórmula única ou fácil, mas parece-me que o que precisamos fazer é atravessar a Sala de Instrução o mais rápido possível, talvez admirando aquelas flores, mas sem inalar seu perfume, sem deixar-se embriagar por ele, sem parar excessivamente, mas apenas o suficiente para tomar nota da lição e seguir em frente, e para isso não há encorajamento melhor do que saber que lá na frente, na Sala da Sabedoria, não há anjinhos a tocar harpa a esperar-nos, mas infinitos irmãos deserdados a quem podemos ajudar agora que sabemos.
(Continua)
Imagem de capa:
Composição MpF
Que maravilha, obrigado pelo importante ensinamento.
Excelente estudo. Abraço de um estudante gnóstico do Brasil.