TEMPO E DURAÇÃO DESDE O PONTO DE VISTA FILOSÓFICO E CIENTÍFICO (segunda parte)

3 Medição de tempo. Pixabay
Urano com Gaia. Public Domain

Continuando o ponto de vista filosófico, mostram-se algumas ideias de Platão contidas no “Timeu”: 

TIMEU: “O que existe sempre, mas não tem devir, e o que é que, tendo-o sempre, nunca existe?”

Segundo a explicação nessa obra, o primeiro é o que sempre existe conforme ao mesmo; o segundo nasce e morre, mas nunca existe no mundo real (arquetípico). Aqui podemos recordar o que disse H. P. Blavatsky quando falava de que o que é, sempre terá sido e sempre será. O resto é uma imagem, que se projeta, e é essa imagem a que existe, como imagem, durante um tempo, pois o que lhe deu origem, tem de ter um fim. Na realidade, estão a contrapor-se os conceitos de “ser” no mundo real e “existir” no mundo material. 

Timeu: “Tudo o que se manifesta, fá-lo necessariamente por algum motivo: é impossível, em consequência, ter uma origem sem motivo”.

Esta frase reflete que não existe a casualidade, antes a lei de causa e efeito, que equivale ao princípio de ação e de reação da Física atual ou a lei do Karma dos Hindus. Esta lei rege sempre no mundo manifestado, aquela que está sujeita ao Tempo na sua parte material (tempo). 

Timeu: “Então, se este universo é belo e o artesão é bom, é evidente que observou o que é intemporal… É evidente em olhou para o que é intemporal… Assim, é necessário considerar que o universo é uma imagem de algo… assim entre a imagem e o seu modelo há que diferenciar…”

Temos, até agora, que o universo visível teve princípio, mas o universo visível é a imagem de algo, que está mais além e que lhe deu origem. Esse algo é Eterno, não está sujeito ao Tempo material, tem uma Duração infinita. 

Passamos agora a ver a causa, porque é que o universo foi criado, porque é que O Eterno dá lugar aquilo que não o é, ao que tem limite, ao que está sujeito ao Tempo material. 

Timeu: “Digamos agora qual foi a causa que levou o criador a criar o devir e este universo. Era bom, e no ser bom nunca habita uma maldade sobre nenhuma coisa. Ao estar isento de qualquer maldade, queria que tudo se tornasse semelhante a ele”.

Esta é a eterna pergunta, o porquê da existência. Para Platão, o mais elevado é o bem. Um “ser” absolutamente bom, necessita atuar, exercitar esse bem, não pode ser egoísta e, portanto, “queria que tudo se tornasse semelhante a ele”. Seria como proporcionar a outros a oportunidade de ser semelhantes a ele. Naturalmente esta é uma explicação que dá características humanas a um “ser” que não é humano, mas embora a forma de explicá-lo seja incorreta, porque não se pode definir com características humanas algo que não é humano, creio que a essência da explicação possa ser válida. Se bem que é impossível para a nossa linguagem apreender as essências no nosso atual nível evolutivo. 

Platão valoriza a velhice ou a maturidade (passar do tempo) como expressão de sabedoria: 

Timeu: “Deus não idealizou que a alma fosse mais jovem… pois não permitiria que, estando juntos, algo mais velho fosse governado por algo mais jovem… converteu a alma na primeira quanto à linhagem e virtude e mais importante que o corpo, como uma senhora e governadora do governado a partir de tais coisas e do seguinte modo: entre a natureza indivisível e que permanece sempre igual, e aquela que se torna em corpos, o deus uniu uma terceira classe da natureza a partir de ambos”. 

Aqui temos a alma como um intermédio entre aquilo que não se altera, que não está sujeito ao tempo (Espirito) e aquilo cuja natureza é a mudança, o movimento (Matéria), conformada com o Uno e do Outro, com algo do seu Pai e da sua Mãe, mas com caraterísticas próprias. Seria um ponto de comunicação, um ponto cujo objetivo é a superação da matéria ou a transformação do material no espiritual. Na antiga Índia simbolizava-se como Shiva, o criador-destruidor, o Fogo dançante. 

Estátua de Shiva em Murdeshwara, Karnataka, Índia. Cretive  Commons

Também podemos ver a analogia deste processo com a tríade de Plotino: Ser, Inteligência e Criação. 

Platão fala-nos também diretamente da origem do tempo: 

TIMEU: “Quando o pai e criador viu que a imagem que tinha nascido dos deuses eternos movia-se por si mesma e que tinha vida, maravilhou-se, e, contente, propôs-se fazê-la mais semelhante ao modelo. Visto que este era casualmente um ser eterno, procurou que, na medida do possível, fosse também perfeito. Certamente a natureza do ser vivente é eterna, e isto não é possível procurar-se por completo no ser gerado. Propôs-se uma imagem móvel da eternidade, e apontando o ponto ao céu, feito de eternidade, que está sempre no mesmo ponto, uma imagem eterna que avança conforme um número a que demos o nome de “tempo”… “era” e “será” são figuras que se originaram a partir do tempo…, mas o que é sempre igual e imutável não chegará a ser nem mais velho nem mais jovem ao longo do tempo, nem é necessário que haja sido gerado em algum momento, nem é agora nem será…” 

Então, numa simplificação, podemos entender o tempo eterno como uma circulação contínua, se bem que estamos a falar do tempo material. A verdadeira Eternidade não pertence ao mundo que se manifesta. O universo assemelha-se a um coração que bate ritmicamente. Esta seria a imagem móvel da eternidade. 

Para terminar o comentário sobre as ideias platónicas, é interessante ver como expressa Platão a possibilidade que tem cada ser humano de perceber a sua própria imortalidade e, portanto as ideias de Tempo, de Eternidade e Duração. Cada ser humano vive o seu próprio mundo e é consciente só daquilo que provoca o seu interesse, deixando de lado aquilo não lhe interessa e, portanto, para ele não tem existência. Desta maneira podemos ver o tempo como uma sucessão de estados de consciência. 

Timeu: “O que se terá aplicado no desejo e na oposição e se entrega plenamente a eles, gera necessariamente opiniões mortais e chega a ser mortal por completo, na medida em que seja possível, e não o descuida pois dedicou-se a ele. O que se entrega ativamente ao conhecimento e aos pensamentos verdadeiros e os põe com frequência em prática nas suas tarefas, é por completo necessário que pense no imortal e no divino, no caso de alcançar a verdade, e na medida em que está permitida à natureza humana participar da imortalidade, que não abandone esse aspeto e, já que se ocupa do divino que possui, deixando satisfeita a divindade tutelar que habita nele (a alma), deve ser antes de tudo feliz”. 

Com este fragmento do Timeu deixamos o ponto de vista da filosofia antiga sobre Tempo e Duração, e começamos com o ponto de vista científico atual sobre estes mesmos temas. 

Medição de tempo.  Pixabay

A ciência atual baseia-se na experimentação. Então, para começar o enfoque científico sobre o tempo e a duração vamo situar-nos no nosso laboratório particular: a nossa vida diária. Nele acreditamos viver só no momento presente, ainda que recordemos o passado e acreditemos que existe um futuro até certo ponto previsível. Em geral, segundo a nossa perceção, é o presente que corre, que se move, o passado não se move e o futuro não existe ainda. 

Embora as leis científicas não dependem de como decorre o tempo concreto. Elas mostram-se fixas, cumprem-se independentemente do tempo concreto em que se manifestam ou se verifiquem. 

A Teoria da Relatividade de Einstein sugere que todos os momentos são reais, não só os que estão a acontecer no que é percebido por alguém como o presente, como o agora. O que poderia indicar, que o passado existiria igualmente tão fixo como o presente e o futuro. Isto recorda-nos o parágrafo de H. P. Blavatsky referido anteriormente: 

As pessoas e as coisas reais e efetivas não são unicamente o que se vê em qualquer momento, mas estão constituídas pela soma de todas as suas condições diversas e mutáveis, desde o momento em que aparecem na sua forma material até que desapareçam da terra. Estas “somas totais” existem em toda a eternidade no Futuro, e passam gradualmente a existir através da matéria para toda a eternidade no Passado. Nada dirá que uma barra de metal alojado no mar, começou a existir quando abandonou o ar, e que deixou de existir enquanto penetrou na água; nem que a barra consistia unicamente na secção transversal dela mesma, que coincidiu em qualquer momento com o plano matemático que separa e ao mesmo tempo que une a atmosfera com o Oceano. Assim sucede às pessoas e às coisas que, caindo no “vai ser” e no “terá sido”, do Futuro e Passado, representam momentaneamente aos nossos sentidos à maneira de uma seção transversal das suas próprias totalidades, conforme vão passando através do Tempo e do Espaço [como matéria] no seu caminho de uma outra eternidade: e estas duas eternidades constituem aquela Duração em que unicamente há algo que tenha verdadeira existência, a qual perceberiam os nossos sentidos se fossem aptos para conhecê-la. 

Alguns cientistas atuais terão chegado à conclusão de que o tempo não existe. Sem dúvida que para nós, tudo decorre no tempo, a história decorreu e decorrerá no tempo, as coisas mudam e movem-se com o tempo ou, pelo menos, assim o percebemos. 

Investigações recentes indicam que o tempo poderia ser uma característica que emerge dos componentes básicos do nosso mundo. Por exemplo, um corpo sólido está composto, em última instância, de átomos, sendo a maior parte do espaço que ocupa, um espaço vazio. Logo, a qualificação de sólido é uma característica emergente ou coletiva dos seus componentes. Esta perceção pode-nos parecer revolucionária como terão sido outras teorias no passado.

Einstein pensava que o passo fundamental para desenvolver a Teoria da Relatividade era a sua forma de entender o tempo.

Albert Einstein. Creative Commons

Os cientistas que pretendem compatibilizar a Teoria da Relatividade e a Mecânica Quântica, acreditam que é fundamental reelaborar o conceito de tempo. Alguns deles consideram que uma forma de fazê-lo é aceitar o mundo sem tempo. 

Segundo as leis do movimento de Newton existe uma sequência em que ocorrem os acontecimentos, que é independente do momento concreto em que estes se sucedem e igualmente podemos saber se um evento concreto ocorre antes, durante ou depois de qualquer outro. O tempo origina ordem nos acontecimentos. Assim, a ideia de simultaneidade é independente do observador e o tempo deve ter continuidade para poder definir velocidade e aceleração. 

O tempo, na Mecânica Clássica, deve ter o conceito de duração, ou seja, uma medida que seja possível saber a separação dos processos nele. Necessitamos medidas para poder comparar. Essa duração deve ser, assim, independente do observador. 

Filosoficamente consideramos a Duração como Tempo Total e as suas manifestações (duração) como soma de tempos ou tempos globais. 

Em resumo, Newton concebeu um tempo objetivo dividido em instantes. Pensava também que o fluir do tempo indica em que direção está o futuro, o qual podemos relacionar com o já mencionado Princípio da Ação e reação, relacionado, por sua vez, com a Lei do Karma ou Lei da Causalidade. 

O conceito Newtoniano de Tempo manteve-se durante quase até ao final do século XIX, quando Ludwig Boltzmann declarou que, como as leis de Newton se cumprem tanto face ao futuro como face ao passado, o fluir do tempo não indica em que direção reside o tempo. 

Posteriormente Einstein eliminou o conceito de simultaneidade absoluta. Segundo a Teoria da Relatividade Especial se dois eventos ocorrem ou não ao mesmo tempo depende da velocidade do observador. O verdadeiro cenário de um acontecimento é o espaço-tempo. Dois observadores que se deslocam a velocidades diferentes não percebem da mesma maneira o quando e o onde ocorre um evento, mas se o farão em relação à sua localização espaço-temporal.

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